segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Vez por outra preciso me reorganizar. Veja, estou apenas colocando pra fora – de novo e de novo – aqueles retalhos que sobraram de mim e que eu sempre tenho que recosturá-los toda vez que teu olhar pressiona o meu sem pudores.

Gatos da noite




Quando a lua rasga o céu, felinos pulam de seus telhados e viram mulheres. 

Calçam seu salto agulha, pintam-se e colocam uma roupa provocante.

Felinos são misteriosos, tem um quê de não dito.

Tomam o último gole da cachaça, jogam o cabelo e agarram a coragem.

São donas das esquinas, com o olhar de rabo de olho são as senhoras da volúpia.

Entre um gole e outro, entre um carro e outro, entre um trocado e outro, abrem-se, mas fecham o coração.

Quantas coisas estão escondidas por detrás daquele batom? Que mulher guerreira está desmoronada, mas sustentada pelos quinze centímetros de seu salto?

Pisam nos pudores de uma sociedade patriarcal e moralista, voam sobre os olhares enojados.

Amanhece, os gatos se recolhem ao seu sono, como corujas. Ou talvez voltem pra casa, com alimento e amor pra sua família. Mas sabem que ao cair da noite, estarão repetindo o mesmo ritual, como um mantra de vida.

Mulheres noturnas são gatos que não se dão o respeito, porque ele já é seu, por direito.

Humanos são inumanos




Humanos são inumanos

São punhais de mentira, é sede de autodestruição

Dedos apontados.


Humanos são inumanos

São dentes que mastigam o impossível

E cospem o inacreditável.


Humanos são inumanos

São corações pretos feitos de retalhos de dor

É estômago revirado, é víscera crua.


Humanos são inumanos

É carne putrefada dominada pela sede de tragédia

É tiro na pedra que jorra culpa.

Humanos são inumanos

É nódoa de sangue vermelho na pele da fome

É miséria açoitada presa na corrente.


Inumano é um ser, é humano.

domingo, 10 de novembro de 2013

Part(ida)


Como se o grito que entala a alma se materializasse virasse fumaça densa que corresse e te enforcasse as palavras.  
Como se o meu coração pulasse na garganta pra avisar que algum líquido escorrega quente sobre minhas veias.
Pra lembrar que o teu não amor foi quem me queimou o juízo e que eu te dei o melhor de mim, eu te dei meus olhos, ternos, sinceros, profundos.

Em troca costas que se viram, boca quem e nega, olhos que me queimam.

domingo, 3 de novembro de 2013

Desaniversário


Chuva fina e flores na cidade cortejam. Cortejam os que se foram, cortejam os que nasceram. Num dia incomum, meu choro irrompeu o mundo, era um grito de protesto por ser arrancada daquelas entranhas quentes e familiares para um mundo estranho, era grito de resistência: seria a luz que nascia num dia preto. Não menos que duas décadas, era a idade que tinha o sorriso, era a idade cravada nas lágrimas que me arrancavam não mais do útero primeiro, mas pariam-me de um jeito estranho e delicioso em um novo nível de consciência: Transcendi e não volto a caber em mim. Rodeada de sorrisos e olhares, tudo se movia paradoxalmente lento e rápido.

terça-feira, 15 de outubro de 2013

Dor que emana

Quem consegue parar a dor humana?
O ser atraca-se à sua própria dor como um cão esfomeado atraca-se à carne.
A dor lhe parece, amiúde, combustível de vida.
Quem consegue parar a dor humana?
O apego ao punhal que dilacera suas entranhas.
Morde o lábio, contrai o maxilar. Tem de suportar a dor.
Quem consegue parar a dor humana?
Crua, nua, aparece-lhe em pontadas escuras, como nódoas de carne.
Pensamentos em redemoinho, ouvem uma nota só, de dor.
Quem consegue parar a dor humana?
Voraz, a dor rebate a pergunta

“Que dor é capaz de parar o humano?”

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Escarlate


Era vermelha a rosa
O lábio cravado na pele do outro também.
Vermelho era o sangue a pulsar
Latejante
Agonizante
Mornamente.
Vermelhas eram as marcas
Como pequenos caminhos
Percorriam-lhe o corpo.
Vermelha era a língua
Guardava segredos
De uma viagem trêmula.
O aroma cheirava a vermelho carmim.
Vermelha era a lembrança de uma noite quente

Uma madrugada azul.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

São minhas lágrimas que escrevem hoje


Uma mulher de corpo frágil, marcado pela bagagem da vida, mas uma alma e um coração fortes, com uma fé inabalável. Nós ainda tínhamos muitos sorrisos pra darmos juntas, eu ainda ia dormir com a senhora, eu juro que ia, eu queria realizar teu sonho, que não era enriquecer, que não era ter bens materiais, era só de conhecer o mar... E agora, sempre que olhar pro mar, pra imensidão, onde o mar encontra-se com o céu, eu vou te sentir, em casa brisa e vou fingir que está do meu lado, de mãos dadas comigo, e eu te seguraria forte se as ondas viessem... eu te protegeria... só precisava de mais um tempo contigo, mais um abraço, talvez ser uma neta melhor, olhar mais umas mil vezes nos teus olhos azuis e perceber o quanto eles falavam e aí eu diria que te amo, que você é a melhor. Promete que cuidará de mim?! Você me enchia de forças e agora eu to precisando tanto, aquela casa dói muito sem você, parece que os móveis choram, que as paredes choram, que o chão, chora, tudo se derrama em lágrimas.
                A senhora já sofreu muito na vida, agora o que mais quero é que esteja em um lugar de paz, em um lugar bonito, igual a tua alma. Vá em paz, eu te amo, como sempre.


domingo, 28 de abril de 2013

Desculpe-me o frio


Quando o frio me guardou em seus braços, eu quis calor. Frio nos deixa aquele vazio não preenchido e aquele gosto de café amargo na garganta, de amor ausente. Quando a noite cai, eu me aqueço na minha própria existência morna, nos meus devaneios incertos e pensamentos melancólicos. Por vezes, sorrio pras estrelas, quando elas aparecem... mas nem sempre elas me devolvem o sorriso. Madrugadas são um templo, onde amantes envolvem-se em tranças de pernas, onde boêmios entoam canções meio desajeitadas de uns goles a mais, mulheres tragam seus cigarros, pessoas dormem, outras refletem...onde pensamentos varrem o juízo como chuva fina lava a calçada e eu, meio tonta de sono, reconheço o peso das minhas palavras e que, a tristeza, real ou inventada, me inspira.

Talvez seja pretensão demais tentar transformar retalhos de alma em poesia, mostrar-me ao avesso pra saberem que por dentro é o meu lado certo... Sou o emaranhado dos meus pensamentos, sou meus suspiros e devaneios mais íntimos, sou a palavra que digo, e a que guardo,  sou meu eu, escondido, puro, meu.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Nudez poética

Muitas coisas me enchem a vista, mas a nudez me encanta! É pura poesia muda contida em cada pura pele, cada marca de vida e singularidade. Tem um quê de verdade, fragilidade, transparência...  Tristes dos que foram treinados a observar a nudez erótica apenas, a nudez com finalidade... perdem de ler a música que enrola e impermeia a pele dos desinibidos.  Da prosa e nota contida em cada entrelinha da (im)perfeição humana! Corpo nu é templo, corpo nu é tela, corpo nu é arte.


Super indico este link de um ensaio intitulado "Nu Honesto", que retrata as mulheres em seu cotidiano, no seu nu subjetivo e sincero.
http://www.araruna1.com/noticia/1685/nu-honesto-fotografo-faz-imagens-de-mulheres-lindas-e-suas-imperfeicoes-confira

segunda-feira, 25 de março de 2013

Tom de sépia


A música que toca agora, me toca na ferida como um dedo toca uma campainha, insistentemente, numa nota só.
O frio que faz agora, esfria as extremidades de mim e do quarto, mas deixa os pensamentos quentes, a memória acesa.
Os barulhos da noite perturbam o sono dos inocentes, dos sem culpa. O silêncio do outro lado da cidade, é cúmplice dos que não calam.
O tom da noite lembra uma fotografia velha, em tons de sépia. Sépia também é o tom de tudo o que poderia ter sido e não foi. Do que foi quebrado as pernas e ficou impossibilitado de andar e hoje se arrasta, agarrado na esperança do existir.
Fecho os olhos tentando ver tudo em preto e branco, mas tudo vira nitidez, cheiro, saudade, devaneio.

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Pra ver se nascia uma planta no chão

Água...
Água no sertão...
Poderiam ser em forma de lágrimas, pelo sofrimento de uma terra seca, onde açudes e barragens agora tornaram-se barro. 
Mas, o que é a água pros sertanejos desta terra castigada pela seca, senão gotas de esperança? Gotas de vida?
A água vem, calma e meio tímida. Mal sabe ela o quanto é bem vinda nesta terra de gente de fé.
Lava a poeira, lava a alma.
O sorriso transborda, o olho também, a felicidade também. Tomara que a barragem também transborde, num futuro próximo.

Sim, esta é minha cidade! A imagem acima é da nossa querida barragem, sem água :/

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

À 2013, com amor



Querido 2013,

Falta muito pouco para nos conhecermos, não é? Ouvi muito falar de você (acho que já posso me atrever a chamá-lo de você, dada a iminência do nosso encontro).  Confesso agora que pensei que você demoraria mais, mas me enganei, e como me enganei! Vejo o quão precipitado você é! Nem bem me despedi ainda de 2012 e você já vem chegando, todo posudo! A impressão que me dá, é que eu e 2012 passamos pouco tempo juntos, que ele veio bem ligeirinho, mas as histórias que escrevemos juntos, daria um livro! Nossa, 2013, seu antecessor foi intenso, muito intenso, mas um ótimo professor.
Se me permite a licença, e se o senhor não estiver muito apressado como todos os anos do calendário sempre estão, posso até arriscar-me a contar um pouco da minha grande aventura com 2012. Espero que leia, e que trate com respeito minhas palavras.
Eu bem me despedia de 2011, com um abraço, e 2012 já chegou brindando, me dando uma pista de como aquele ano seria. Prometeu, e cumpriu!  De primeira, me contou que eu conheceria muita gente, e ele acertou em cheio.  Foi um ano de muitas viagens, dentro e fora de mim. Nestas viagens,  pessoas, subjetividades, singularidades. Algumas passavam despercebidas;  outras passavam, marcavam, mas passavam; algumas, estava ridiculamente perto de mim, bem ao alcance das mãos, e eu sempre as deixava passar. Dessa vez foi diferente, houveram muitas que eu agarrei, tantas outras que me agarraram! Essas você irá conhecer, pode ter certeza, amigo.
 Cada tocar de alma, enriqueceu-me de um jeito que poderia eu fazer inveja a qualquer sheik árabe, cuja maior riqueza se traduz em ouro e posses. São almas, coloridas, esvoaçantes, maciças, singulares, risonhas. São probabilidades.  Ganhei sorrisos! Alguns, até tive que arrancar pra conseguir, você acredita? Outros, eu tive que trocar pelos meus, e ainda, joguei ao vento milhares de sorrisos meus, mesmo se eu não esperasse nenhum em troca (mas assumo, eu sempre esperava). Olhares? Tenho aos milhares, cada um com sua cor, cada um com uma intensidade, um trejeito, inesquecíveis, me piscam a cada memória do seu dono. Abraços, afetos, amigos, risadas pra lá de sonoras,  palavras de carinho? Incontáveis.
Conheci muito o outro, para conhecer melhor ainda o eu. E eu que achava que me conhecia o suficiente! Que tola! O ser humano está em constante mutação e, uma hora ou outra, você vai desconhecer-se. Me desconstruí, para construir um eu renovado, um eu ativo, um eu engajado, um eu mais eu, assim como a lagarta, que perde o medo do casulo escuro, que larga o comodismo e as coisas conhecidas e se lança à uma nova empreitada em busca do novo, mesmo com medo do que possa encontrar. Imagine só encontrar asas, cores, sentidos!  Você pode descobrir que o novo é mesmo fascinante, e que, você pode também preservar o velho.  O ser humano é um ser adaptável! Tenho asas, tenho cores, nomes e características.
É por essas vivências, tão marcantes, 2013, que sinto já saudade de 2012. Mas, acho que depois de toda essa nossa conversa você já me conhece um pouco, e eu te conheço um outro tanto. Como isso é possível? Eu te vi passeando em cada olhar esperançoso e ansioso que te busca, em cada promessa feita, na tentativa de ser posta em prática, em cada oração silenciosa, que clama por um ano melhor, por novas chances. É, você já está quase aqui. Na certa, deve estar atrás de mim, terminando de ler esta carta para, finalmente, me conhecer. Tenho vontade de me virar e ver logo sua cara. Como será você, 2013? Por favor, seja bonzinho comigo, tá? Seja temperado, seja doce, agridoce, seja singular. Contagem regressiva. Rolhas disparadas dos pescoços do champanhe. Branco. Dourado. Os fogos de artifício enfeitam o céu e me entrega-o de presente. O relógio zera, o minuto para. É hora de virarmos, cara a cara. Um novo ano, um novo capítulo, 365 folhas em branco.  A mente repete o mantra, é hora de evoluir. Apenas mais um segundo e... eu sabia que você estava bem atrás de mim! BEM VINDO, 2013.